Dentre os artistas que participaram da Semana de Arte Moderna, lá estava ele, Mário de Andrade.
Assim, dada a indiscutível contribuição que essa nobre figura concedeu à
literatura, música, crítica e à história da arte, voltemos nossa
atenção para a vida e obra desse grande representante, que tão bem
abrilhantou o cenário de nossas letras.
Mário Raul de Morais Andrade nasceu em 1893, em São Paulo. Depois de
ter concluído seus estudos primários no Grupo Escolar da Alameda do
Triunfo, em 1909 se formou no primeiro grau como bacharel em Ciências e
Letras, no Ginásio Nossa Senhora do Carmo dos Irmãos Maristas. A partir
de 1910 começou a frequentar a Escola de Comércio Álvares Penteado,
cursando Filosofia e Letras, contudo o curso teve de ser interrompido em
função de uma briga com um dos professores. No ano seguinte, ingressou
no Conservatório Musical de São Paulo no intuito de estudar piano.
Tornando-se habilitado em tal função, em 1917 (ano da formatura dele)
virou professor de História da Música.
Nesse mesmo ano publicou o livro Há uma gota de sangue em cada poema, sob o pseudônimo de Mário Sobral. Dando prosseguimento à carreira de escritor, publicou Paulicéia Desvairada,
em 1922 – sua primeira obra considerada tipicamente modernista. Em 1924
empreendeu a primeira viagem rumo “às descobertas do Brasil”;
acompanhado por alguns de seus amigos também modernistas, foi para Minas
Gerais e visitou as cidades históricas. A essa altura já se mostrava
como um pesquisador das artes literária e musical, além de ser um
estudioso do folclore brasileiro.
Após ter participado do evento que demarcou a Semana de Arte Moderna,
seu nome passou a ter uma projeção nacional, fato que o fez presidir o
Departamento de Cultura da Prefeitura de São Paulo, compreendendo o
período de 1934 a 1937. Veio a falecer na mesma cidade em que nasceu,
São Paulo, em 1945.
Razões ideológicas sempre foram a mola-mestra das expressões artísticas
que compuseram o campo literário de uma forma geral. Dessa forma, com a
publicação de Há uma gota de sangue em cada poema (1917),
mesmo não tendo obtido a expressividade que lhe era necessária (uma vez
que nele ainda estavam nítidos traços parnasianos e simbolistas),
podemos constatar o anseio do poeta em usar a literatura como
instrumento de defesa e da paz, aludindo aos horrores conclamados pela
Primeira Guerra Mundial.
Paulicéia Desvairada foi uma de suas produções realizadas
entre 1920 e 1921, na qual se evidenciam traços autenticamente
modernistas, sobretudo demarcados por influências das ideias
vanguardistas: futurismo, a escrita automática e traços surrealistas.
Outro aspecto que também se evidencia é o uso de versos livres, de uma
linguagem solta e “desvairada”, repleta de associações livres. Assim,
atenhamo-nos a alguns fragmentos:
Inspiração
São Paulo! comoção da minha vida...
Os meus amores são flores feitas de original...
Arlequinal!... Traje de losangos... Cinza e Ouro...
Luz e bruma... Forno e inverno morno...
Elegâncias sutis sem escândalos, sem ciúmes...
Perfumes de Paria... Arys!
Bofetadas líricas no Trianon... Algodoal!
São Paulo! comoção de minha vida...
Galicismo a berrar nos desertos da América!
Os meus amores são flores feitas de original...
Arlequinal!... Traje de losangos... Cinza e Ouro...
Luz e bruma... Forno e inverno morno...
Elegâncias sutis sem escândalos, sem ciúmes...
Perfumes de Paria... Arys!
Bofetadas líricas no Trianon... Algodoal!
São Paulo! comoção de minha vida...
Galicismo a berrar nos desertos da América!
Seguindo a mesma linhagem, destacamos Ode ao burguês, declamado em uma
das noites da Semana. Nele se constata um toque de ironia fazendo menção
à superficialidade e ao conservadorismo da burguesia – marca registrada
do autor:
Eu insulto o burguês! O burguês-níquel
o burguês-burguês!
A digestão bem-feita de São Paulo!
O homem-curva! O homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,
é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!
Eu insulto as aristocracias cautelosas!
Os barões lampiões! Os condes Joões! Os duques zurros!
Que vivem dentro de muros sem pulos,
e gemem sangue de alguns mil-réis fracos
para dizerem que as filhas da senhora falam o francês
e tocam os “Printemps” com as unhas!
o burguês-burguês!
A digestão bem-feita de São Paulo!
O homem-curva! O homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,
é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!
Eu insulto as aristocracias cautelosas!
Os barões lampiões! Os condes Joões! Os duques zurros!
Que vivem dentro de muros sem pulos,
e gemem sangue de alguns mil-réis fracos
para dizerem que as filhas da senhora falam o francês
e tocam os “Printemps” com as unhas!
Eu insulto o burguês-funesto!
O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições!
Fora os que algarismam os amanhãs!
Olha a vida dos nossos setembros!
Fará sol? Choverá? Arlequinal!
Mas as chuvas dos rosais
O êxtase fará sempre Sol!
O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições!
Fora os que algarismam os amanhãs!
Olha a vida dos nossos setembros!
Fará sol? Choverá? Arlequinal!
Mas as chuvas dos rosais
O êxtase fará sempre Sol!
[...]
Em Losango Cáqui o poeta traz, a partir do título do livro, a figura do losango, mencionada em vários de seus poemas, bem como a figura implícita e carnavalesca do arlequim, cujos pedaços de sua roupagem (assemelhando-se a uma colcha de retalhos) tão bem representavam a cultura brasileira – marcada por influências estrangeiras. Clã do jabuti e Remate dos males são obras nas quais Mário de Andrade deixa nítido seu interesse pela cultura nacional, pelo estudo das raízes brasileiras. Para tanto, explora o folclore e os costumes regionais. No afã de demonstrar essa mescla de influências, Mário se tornou conhecido por sua habilidade na prosa, por meio de uma de suas notáveis criações, Macunaíma – o herói sem caráter. Nela, o poeta faz uma junção entre lendas e mitos indígenas, ditos populares, piadas, expressões e rituais do Brasil, os quais vão se sobrepondo e se alternando mediante o apresentar de toda a obra. Eis alguns fragmentos, a título de representação:
"Uma feita a Sol cobrira os três
manos duma escaminha de suor e Macunaíma se lembrou de tomar banho.
Porém no rio era impossível por causa das piranhas tão vorazes que de
quando em quando na luta pra pegar um naco de irmã espedaçada, pulavam
aos cachos pra fora d’água metro e mais. Então Macunaíma enxergou numa
lapa bem no meio do rio uma cova cheia d’água. E a cova era que-nem a
marca dum pé-gigante. Abicaram. O herói depois de muitos gritos por
causa do frio da água entrou na cova e se lavou inteirinho. Mas a água
era encantada porque aquele buraco na lapa era marca do pezão do Sumé,
do tempo em que andava pregando o evangelho de Jesus pra indiada
brasileira. Quando o herói saiu do banho estava branco, louro e de olhos
azuizinhos, água lavara o pretume dele. E ninguém não seria capaz mais
de indicar nele um filho da tribo retinta dos Tapanhumas.
Nem bem Jiguê percebeu o milagre,
se atirou na marca do pezão do Sumé. Porém a água já estava muito suja
da negrura do herói e por mais que Jiguê esfregasse feito maluco
atirando água pra todos os lados só conseguiu ficar da cor do bronze
novo. Macunaíma teve dó e consolou:
Olhe, mano Jiguê, branco você ficou não, porém pretume foi-se e ante fanhoso que sem nariz. [...]
Amar, verbo intransitivo também é outro destaque de cunho prosaico deste nobre autor. Na obra, ele deixa de ser visto como alguém bastante influenciado pelas correntes marxistas e freudianas, associadas a um tom relacionado a uma contundente crítica social.
Amar, verbo intransitivo também é outro destaque de cunho prosaico deste nobre autor. Na obra, ele deixa de ser visto como alguém bastante influenciado pelas correntes marxistas e freudianas, associadas a um tom relacionado a uma contundente crítica social.
O marco inicial do movimento modernista brasileiro foi a realização da Semana de Arte Moderna de 1922, onde diversos artistas plásticos e escritores apresentaram ao público uma nova forma de expressão,o evento ocorreu em São Paulo.
ResponderExcluirMario de Andrade ,qual era irmão do grande Oswaldo de Andrade foi de grande importância para o movimente a qual e conhecido como modernismo ,tal como um dos protagonistas ,participante também da semana de Arte moderna ,como grande escritor que foi nossa nação ate os dias de hoje colhe tais frutos deixados pelo seu grande e inesquecível talento.
ResponderExcluirMario de Andrade foi um dos maiores escritores brasileiros, pelas suas críticas e ironias, foram de grande importância para semana da arte moderna, onde contribuiu para o modernismo. Nesse evento, apesar das vaias, foi de grande importância pois fez o Brasil se desvincular da arte européia e conseguir uma identidade própria para sua arte.
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